O mundo todo é um grande skatepark. Aviões pra todo lado, passagens cada vez mais baratas e skatistas se conectando em todas as partes do mundo tem facilitado muito o deslocamento e a estadia em países distantes.
Nosso novo colaborador aqui na CemporcentoSKATE, o jornalista (e skatista desde 1993), Armen Pamboukdjian esteve recentemente na terra de seus antepassados, a Armênia, e contou um pouco da cena de lá.
Sua familia é Armênia? Como é a descendência?
Minha família é de descendência Armênia, mas eu nasci no Brasil. Na época do Genocídio Armênio em 1915 minha família, tanto da parte do pai, quanto da minha mãe, fugiu para o Líbano, país onde os armênios estavam sendo bem acolhidos. O Líbano acolheu tão bem os armênios que existem pequenas cidades armênias em algumas regiões libanesas.A comunidade Armênia do Líbano é uma das maiores de toda a diáspora. De lá eles migram para outros países, como aconteceu com minha família que veio parar no Brasil.
Quantas horas de voo até a Armênia?
Para se chegar à Armênia é preciso fazer escalas. Então foram 12 horas de SP até Londres, e depois mais 6 horas até a Armênia. Pode ser pela França também e é praticamente o mesmo tempo de vôo.
A população é jovem?
A população Armênia é jovem, no entanto um grande número deles deixam a Armênia todos os dias, em busca de melhores oportunidades nas regiões vizinhas como o Irã e Rússia, principalmente. Alguns que tem melhores condições conseguem ir para algum outro pais da Europa, ou mesmo do Leste Europeu. A população da capital é 97% alfabetizada. Ao terminar os estudos os jovens buscam trabalho nos outros países, infelizmente!
Como as autoridades policiais encaram o skate por lá?
O skate não é bem visto pelas autoridades na Armênia que é bem repressiva, diga-se de passagem. Nas ruas de Yerevan (capital) não se pode andar de skate. Em local nenhum é permitido. As calçadas são ruins, com um estilo de pedra que tem frisos a pouca distancia um do outro. Assemelha-se à Pedra Portuguesa que estamos acostumados a enfrentar no Brasil. Além do mais, não é possível andar em qualquer lugar, qualquer calçada. Tentei utilizar a calçada de um banco e o segurança logo saiu e eu pedi desculpas e expliquei em idioma armênio que eu não era de lá e fui embora. O único local que os skatistas podem praticar livremente é a praça da Ópera, que tem uma escadaria, dois monumentos de mármore e um asfalto liso. A praça tem também uns bancos de metal, porém bem curtos, mas da pra mandar algumas manobras. Lá é o ponto de encontro do skatistas de Yerevan, mas colam bikers e rollers também, e ninguém reclama dos skatistas.
Existem skateparks? Skateshops? Quem marcas são os skates/tênis dos armênios?
Skateparks nem pensar. Não existe nenhuma, e era a grande queixa dos skatistas armênios quando comecei a indagar sobre a cena do skate local. E parece que eles viam a mim como uma espécie de salvador, alguém que poderia fazer algo por eles. Não sei nem o que e nem como, mas espero poder fazer algo um dia por eles.
Quanto à Skateshops, propriamente ditas, não existem. O que existe é uma loja que vende souvenirs. Shapes e tênis vem da Europa, ou até da América, comprados em sites de grandes skateshops que entregam no mundo todo, mas é tudo muito caro. As marcas que encontrei na Armênia foram Nike,Zero, Element, Flip e algumas outras. Não existe uma cena definida. O número de skatistas não passa de 50 em Yerevan. É nesse sentido que penso em fazer algo pelo skate na Armênia um dia.
Quem são os ídolos da juventude armênia?
Se forem skatistas, os armênios conhecem nomes como Nyjah Huston, Paul Rodriguez, Bob Burnquist, Rodney Mullen, Chaz Ortiz, nomes que estão em evidência no cenário do skateboard mundial. Não conhecem muito os skatistas brasileiros, mas sabem da qualidade dos mesmos.
Se não for skatista, a juventude Armênia (de maneira geral) idolatra os seus fedayis (Voluntários que sempre defenderam a Armênia e buscaram formar um Estado Independente com os territórios milenares dos armênios). Em suma esse ídolos são da época em que a Armênia foi dominada e teve seus territórios usurpados pelo Império Otomano. Na época do Genocídio Armênio (1915) e os Fedayis resistiram às deportações e matanças em diversas regiões da Armênia, como nos vilarejos de Musa Dagh e Zeitoun. Existem ainda os Fedayis que lutam pela independência da República de Artsakh (mais conhecida Nagorno Kharabakh), uma região armênia que foi anexada ao Azerbaijão em 1918 pelo líder Soviético Joseph Stalin, quando a Armênia (ou os 10% do que sobraram dela pós genocídio) passou a fazer parte da extinta União Soviética, assim como acontece com os países vizinhos. Ao fim da URSS (1991), a Armênia se tornou independente mais uma vez e retomou esse território historicamente habitado por Armênios em 1994. A região tem população 95% de origem armênia, mas ainda hoje o Azerbaijão tenta retoma-lo por meio da violência e agressões belicistas.
Enfim, é muita história…
O que é importante que se diga sobre a Armênia?
Importantes são os fatos históricos e culturais, e claro, a tentativa de extermínio do povo armênio pelos turcos otomanos (Entenda: www.genocidioarmenio.com.br). Dizer que a Armênia é o primeiro povo a aceitar o Cristianismo oficialmente como religião de Estado. Foi em 301 DC, anunciado pelo Rei Drtad III. A Armênia é a terra das igrejas, existem um número incontável de igrejas no território armênio atual e no histórico, que foi usurpado e hoje faz parte da Turquia moderna.
Outra coisa importante é a Diáspora Armênia. Os Armênios se espalharam pelo mundo após o genocídio criando uma grande diáspora (mais de 8 milhões de armênios pelo mundo). Em Abril de 1915 os lideres do partido dos jovens turcos (comitê de União e Progresso da Turquia) planejaram e executaram a matança e deportação de todos os armênios que viviam dentro do Império Otomano enquanto o mundo todo olhava para a Primeira Guerra Mundial, que acontecia a mesmo tempo. Os armênios tiveram que deixar suas casas e suas terras milenares e fugir para outros países como Líbano, Irã, Síria, Grécia, entre tantos outros para escapar das matanças. A Armênia que existe hoje é aproximadamente 1/10 do tamanho da Armênia Histórica, que é conhecida há mais de 4 mil anos.
E é importante dizer que a Armênia também é conhecida pelo Monte Ararat (5165 mts), ícone da Armênia e do povo Armênio. A Bíblia cita que a Arca de Noé parou no cume do monte Ararat , após o dilúvio. Para quem é cristão aquela montanha é sagrada. Especialmente para os armênios, que viviam dos dois lados dessa montanha, mas hoje habitam apenas um deles. O Ararat é um dos símbolos mais importantes da Armênia, hoje faz parte do território turco, não significando nada pra eles, mas temos a esperança de tê-la (a montanha e as terras) de volta um dia. Essa é uma das maiores tristezas de qualquer armênio: a perda da montanha para a Turquia.
Você apresenta um programa de rádio, certo?
Há mais de 3 anos sou o apresentador do Programa Radiofônico Armênia Viva, pela rádio Trianon AM de SP com notícias sobre a Armênia, musicas Armênias, entrevistas, comunicados locais e muitas notas sociais. Só em SP a comunidade Armênia tem em torno de 25.000 membros, no Brasil são quase 40.000. Alem do programa de rádio eu e mais alguns amigos como um professor, um historiador e um designer unimos forças no ano passado (2010) e criamos o Portal Estação Armênia (www.estacaoarmenia.com.br), um portal na internet com notícias e tudo mais sobre a Armênia como a história do genocídio, notícias, artigos e colunas e que também aloca os arquivos do Programa Armênia viva para ouvir e baixar. Eu também faço parte da Federação Revolucionária Armênia no Brasil – O TASHNAGTSUTIUN que é um partido político Armênio com mais de 120 anos. Na diáspora, A FRA se encarregou de manter a Armenidade viva, ajudando a construir escolas, clubes e igrejas nos países onde houvessem Armênios, e está em atividade até hoje e é uma das mais respeitadas organizações Armênias. Sou um dos diretores do comitê nessa gestão. E ainda sou do corpo editorial do Portal Estação Armênia, um portal de notícias pros Armênios no Brasil e que também aloca o podcast dos programas de rádio que apresento.