(publicado na CemporcentoSKATE 119, setembro/2008, página 102)
A vontade incontrolável de ter um tênis único, personalizado, fazia com que descarregássemos Bics para que nem mesmo um pé fosse igual ao outro. Isso agora chama-se customização. Não queremos mais assistir os clips que a MTV passa. Queremos ver os que gostamos. Aliás, não queremos nem assistir. Queremos é fazer o nosso próprio vídeo.
Os artistas cansaram de esperar as galerias de arte abrirem suas portas. Resolveram publicar seu trabalho na rua, onde passa muito mais gente. A tal “sponsor me tape”, levada de mão em mão, nem é mais tape. Andei, acertei, filmei, editei e postei. Se alguém ver, passar o link pra outro, e esse outro mandar pra outro que tiver uma marca e quiser me mandar um shape, negócio fechado. Mas não pedi pra ninguém assistir. Se viu foi porque quis. Se gostou, valeu! Não se espera mais que sejam retirados os tapumes pra descobrir como ficou a pista. O negócio é fazer o projeto, levar pra quem decide. Não queremos mais skateparks genéricos. Queremos o nosso skatepark.
Não quero mais só escutar uma notícia e, indignado, comentá-la com meu cachorro. Quero que saibam o que achei. E se bobear, quem dá a notícia sou eu, e nem boa noite ao final vou me propor a dizer. Desculpe nossa falha porra nenhuma! Seja informado e descubra por si mesmo!
A tal interatividade está mudando o curso da história. As emissoras de TV sabem que os sofás estão vazios. A audiência despenca, não por causa da outra emissora, mas sim porque cada um está no seu quarto criando sua própria central de distribução de som e imagem pelo seu computador e assistindo as montadas por seus semelhantes. E conseguindo patrocínios pra isso. Era só uma ideia punk. Agora, o do-it-yourself serve pra tudo. Mas só quem fizer bem feito vai sobreviver.
P.S.: Esse texto foi publicado na CemporcentoSKATE 119, setembro/2008, página 102, numa coluna chamada “Dando Ideia”, cujo autor variava a cada edição. Relendo hoje, não vejo nada de premonitória, mas sim fruto de observação daquele momento. Nem imaginaria que o fato de cada um dar suas próprias notícias pudesse tornar-se uma fábrica de mentiras, nem que não precisaríamos de um computador para fazer isso. Admito que minha visão era bem mais otimista na época, e não via tantas possibilidades negativas na tal mudança de curso da história. Outro fato curioso é que a arte da página, assinada pelo Estúdio antihorario, trazia um certo pioneirismo com algo que se parecia com um “mapa de palavras”, nesse caso mais como estética do que função, mas que hoje em dia é comum pra medir sobre o que está se falando.