
Gonz no Mönchengladbach Art Museum, Alemanha, 1998 (Foto Helge Tscharn)
Em 1998, o norte-americano Mark Gonzales – um dos maiores skatistas de todos os tempos – visitou a Alemanha, mas não para correr o Mundial de Münster. Já consagrado no skate, Gonz preparava-se para cravar seu nome na história da arte, com a primeira intervenção de skate dentro de um museu.
Como isso foi possível? Naquela época, Gonzales havia acabado de lançar um livro na Alemanha, chamado “Broken Poems”. O editor do livro, Michael Zollner, vinha conversando com ele, e numa dessas conversas surgiu a ideia de uma intervenção de skate num museu. Zollner gostou da proposta e a apresentou ao diretor do Museu de Arte de Mönchengladbach, uma pequena cidade alemã. Para surpresa geral, o diretor topou.
Assim, as paredes brancas do Mönchengladbach Art Museum, que já tinham recebido peças valiosas de nomes como Andy Warhol, Bruce Nauman e Damien Hirst, receberam naquele 13 de dezembro o skate também valioso de Gonzales. As rampas foram etiquetadas, como se fossem obras. E de fato eram. A estética do skate elevada ao patamar de arte.
Uma música começou e uma voz saiu dos alto-falantes: “Fiquem calmos”. O público (misto de skatistas com fãs de arte) aguardou, sem saber direito o que estava por vir. Então surgiu Gonzales, com uma roupa branca esquisitona, dando impulsos em alta velocidade. Não havia manobras técnicas em jogo. Gonz deslizava pelo chão liso, sumia, e surgia novamente, sempre no gás. Podia sair do raio de visão, mas o barulho do skate ecoava pelos corredores tão acostumados ao silêncio: a lembrança de que algo muito diferente estava acontecendo ali.
Seus wallrides o transformavam, naquele milésimo de segundo, numa legítima obra de arte. Pendurado na parede, como um quadro de Warhol. Surreal é a palavra. Durante dez minutos Gonz virou uma instalação viva, fornecendo um novo sentido para o termo skate-arte.
Além da performance no museu, Gonz ainda fez quatro leituras de trechos do seu livro, em diferentes cidades da Alemanha. Em Cologne, por exemplo, a leitura aconteceu numa escola. Diferente da segurança apresentada em cima do skate, lá ele estava num território que não era o seu (Gonz não teve uma educação formal), e mostrou-se nervoso, inseguro até. Mas encarou o desafio.
Gonz, como sempre, à frente do seu tempo.

Mark Gonzales, wallride body varial, 1998. Foto: Helge Tscharn
[Essa matéria foi publicada originalmente na edição 126 da revista CemporcentoSKATE, em 2008, para celebrar os dez anos da intervenção do Gonzales no museu. O fotógrafo alemão Helge Tscharn presenciou – e registrou – esse momento histórico: as fotos aqui reproduzidas pertencem ao vasto e rico acervo do Helge. O ciclo de homenagens teve mais um capítulo em 2018, quando Gonz fez uma releitura da performance em Nova York, no Milk Studios. Você pode assistir ao “remake” de 2018 logo abaixo, bem como ao original de 1998, da fotógrafa e cineasta Cheryl Dunn, embora eu não tenha certeza de que essa seja a versão na íntegra. Ah, e vale o registro: Gonz aplicou o lindíssimo wallride body varial nas duas oportunidades, com vinte anos de diferença entre uma e outra.]
Releitura de 2018:
Original de 1998:
Em tempo: ainda em 2020, no mês de setembro, teremos mais Mark Gonzales, dessa vez em livro (Rizzoli Books) com fotografias de Sem Rubio. O livro já está em pré-venda.