PARTE DE QUÊ?

“Você viu a parte do Jovontae Turner no Love Child?”

“O Uni.Versus é bom demais. A parte do Akira é incrível.”

Acredito que o termo “vídeo parte” tenha surgido em conversas desse tipo. Num vídeo com diversos skatistas (os chamados full lenght) quem assiste sempre acaba tendo um trecho, ou parte, preferida, inesquecível. Tem a discussão sobre quem abre, quem fecha, a “parte dos amigos”, os tombos, enfim, diversos segmentos dentro de um filme.

É muito mais fácil fazer um vídeo individual, de um só skatista. Basta casar apenas duas agendas, a de quem vai manobrar e do videomaker. Por conta disso, tornaram-se extremamente comuns na era digital. Tivemos uma seção conjunta site/revista chamada Videoparte CemporcentoSKATE, justamente pra divulgar esse tipo de trabalho. Fazer um vídeo com cinco ou seis skatistas, por exemplo, demanda muito mais tempo, os problemas e decisões a serem tomadas crescem exponencialmente. Por isso os vídeos longos são cada vez mais raros e deveriam, ao menos, serem mais valorizados. É difícil encontrar uma música boa, que encaixe, e tenha seus direitos de uso negociados ou liberados? Pense em seis. Ou sete. Um skatista costuma se machucar? Imagine meia dúzia. Encontrar bons picos pra um tá difícil? E pra oito?

Por tudo isso, quando um skatista lança um vídeo desse tipo, individual, sempre fico na dúvida: é parte de que?

“Você viu a parte do Suciu, chamada Verso?

“E a vídeo parte do Tiago, pra New Balance? Já vi 10 vezes e ainda não acredito no nível que ele chegou!”

Eu não enxergo razão em chamar de “vídeo parte” algo que se encerre em si mesmo, que não faça parte de um todo. Sei que é algo já aceito e absorvido no skate, mas indo pra semântica, não faz nenhum sentido. E como tenho certa preocupação com a forma que as palavras são empregadas (e acredito até que o mau uso de algumas delas tenha contribuído pra nos metermos nesse atual poço sem fundo político/social), achei justo discutir o uso. Essa é mais uma daquelas discussões pouco relevantes e talvez muito importantes, ou seja, as mais legais de se ter depois da sessão.

Não vai aqui nenhum desmerecimento pra vídeos individuais. Até citei apenas dois ali, entre tantos, inesquecíveis desde a primeira assistida. É só uma questão do uso do termo. Nos textos que eu assino, chamarei apenas de vídeo. Não é o comum, é coisa minha. É só pra avisar quem me lê que a ausência do “parte” não foi esquecimento.