O coletivo Flanantes que está sempre na atividade produzindo, apresenta mais uma obra audiovisual de ótima qualidade, da mente criativa de Murilo Romão que está sempre aplicando nas ruas as ideias dos livros que lê, contextualizando conceitos que conversam muito bem com o estilo de vida do skate, em sua interação com espaços urbanos e etc.
O vídeo foi gravado entre Brasil e Europa, trazendo aquele mix democrático de todos tipos de skatistas dos mais diversos estilos, além de uma homanagem muito bonita para Marcos Mamá (1978-2024), uma grande lenda e referência do skate brasileiro, vale muito a pena conferir o vídeo, parabéns aos envolvidos!
“Ka é o título do novo vídeo do coletivo Flanantes, inspirado na obra Walkscapes: o caminhar como prática estética, de Francesco Careri, autor presente em trabalhos passados como, Zonzo.
Segundo este autor, o conceito egípcio do ka simboliza o “eterno errar”, o movimento e a força vital. Traz consigo a memória de longas e perigosas migrações paleolíticas. A eterna errância está presente nas perambulações do vídeo, por São Paulo, Campinas, Bauru, Jaú, São Bernardo do Campo, Barretos, Balneário Camboriú, Barueri, e a mítica Barcelona e a urbanística, Bourdeaux.
O ka é uma força que nos conecta com o cosmos e nos conecta a todos, seu hieróglifo é representado por dois braços levantados, indicando como a energia divina era transmitida do deus, como infusão direta do alto. O símbolo do Ka, com as mãos de dimensões desproporcionais, está ligado ao gesto de adoração ao sol, neste trabalho, espelhado em prédios e refletido nas pedras. Símbolo presente desde a pré-história de muitas culturas, da África à Escandinávia. O Ka tem íntima relação com a arquitetura antiga, arquitetura que atravessou os tempos e é reinterpretada pelos skatistas contemporâneos e suas errâncias. De acordo com Siegfried Giedion: “Existe uma ponte que une as concepções religiosas dos tempos primordiais lá onde menos se supõe. É o conceito de Ka, que posteriormente foi elaborado pelos teólogos de Heliópolis e incorporado ao seu sistema religioso […]. As origens da arquitetura em pedra estão inseparavelmente conectadas ao conceito do Ka, e foi precisamente o Ka do fundador da terceira dinastia, o rei Djoser, que deu origem à arquitetura em pedra […] o único material que poderia conter o Ka.”
Para Francesco Careri, enquanto no mundo dos vilarejos e dos campos agrícolas o percurso errático se tinha transformado em traçado, portanto em estrada, dando lugar à arquitetura da cidade, nos espaços vazios do universo nômade, o percurso conservava os elementos simbólicos da errância paleolítica e os transferia para os espaços sagrados dos templos religiosos. No Ka dos Flanantes, a arquitetura, o sol, a simbologia, os percursos errantes, são inseparáveis. Estão contidos nas sessões de Peter Volpi, Garota Fakie Flip, Maikon Quaresma, Manuella Moretti, Victor Gonçalves, Rafael Gomes, Didi Wanks, entre outros (as), cuja trilha sonora é embalada por MNTH, Papete e Mamelo Sound System, com arte assinada por Gabriella Santana. O Ka não nos abandona, nunca!”
Texto por Fábio Luiz Pimentel